Ensaio sobre a Cegueira (Blindness, 2008) é o filme adaptado da obra literária de mesmo nome do autor português José Saramago. A trama envolve uma misteriosa epidemia de cegueira branca, fazendo com que os infectados sejam colocados dentro de um antigo sanatório.
O ditado “Em terra de cego quem tem um olho é rei” é questionado nessa história, a personagem de Julianne Moore é a única que pode enxergar. Mas ao invés de se sentir aliviada, cada vez mais se sente condenada a ser a única a ver a imundice que todos começam a se sujeitar e viver. Em uma cena ela ameaça contar para todos que pode enxergar, nesse ponto eu não pude deixar de fazer uma ponte a outro filme, Dogville (2003). Fiquei um tanto quanto preocupado em ver mais uma vez uma protagonista torna-se escrava de pessoas que teoricamente ajudava. Mas ainda bem que o filme não segue, mais ou menos, por esse caminho.
A cegueira branca para mim pode ter caráter divino, como um teste aos valores humanos. Posso estar arriscando ser maniqueísta demais, embora ajam situações que comprovem minha opinião. Como a diferença existente entre as alas principais do local de confinamento, de um lado a Ala 1, clara e iluminada (mesmo que digam que seja por causa da personagem que enxerga, mas o contraste é óbvio) ainda com resquícios de moral. Enquanto a Ala 3, dominada por um cínico personagem de Gael Garcia Bernal, perdera toda moral humana esta queda nos conceitos é representada com a ambientação escura que a mulher do médico (Moore) evidência em uma das seqüências mais “sujas”.
Ainda na questão da cegueira, Meirelles brinca um pouco nas imagens. Em uma das cenas de sexo, que começa com carícias e beijos, ela fica completamente branca, participamos da cegueira dos personagens. E por um momento achamos que aquela não é uma cena de sexo, mas de amor, por causa da imagem branca e suave. Mas corta a cena novamente para o sexo sujo e agressivo, tirando-os rapidamente do conceito suave de antes. O diretor mostra que ali dentro a suavidade está cada vez mais distante e que os instintos prevalecem.
Após o confinamento o grande motivo para a cegueira é mostrado, a meu ver, sutilmente. Sob o comando da mulher do médico, o pequeno grupo tenta sobreviver ao caos que se espalhou no mundo, surge então a solidariedade em um grupo de estranhos, uns ajudando aos outros. A cegueira começa a fazer parte da vida deles, de cada um. Não pretendo dizer se a epidemia é controlada ou não, mas após chegar a um nível de relacionamento solidário, causa até medo para alguns que todos voltem a enxergar, pois fica a dúvida se a humanidade aprendera a sua lição.
Ensaio sobre a Cegueira mostra os limites físicos e mentais do ser humano quando perde algo que sustentava seu conforto. É preciso “ver” para entender as questões que o filme aborda. Um ótimo trabalho de Fernando Meirelles.
Nota: 9,5
Rafael Sanzio
2 comentários:
Caramba, fiquei super impogado para ver o filme... Rafa vou ver se consigo ir na sessão de pobre do Manaíra na segunda feira... imediatamente ^_^
Vou pedir para q vc tb dê sequência as suas críticas muito bem escritas e elaboradas em um outro segmento do cinema q tb faz muito sucesso (ao menos lá em casa)... Pq vc não experimenta fazer uma crítica de um dos filmes do Tela Class (Hermes e Renato) hahahahahahaah... tenho até os filmes que gostaria de lhe indicar...
- Memorias de um Ninja Loki
- Piratas do Carilha
Ambos vc acha no YouTube...
Abração Rafa!
Realmente ...
Esse filme me surpreendeu, de todas as formas possivéis e imagináveis, de certo, considero um dos melhores trabalhos de Fernando.
Vale destacar, o Saramago a la Niemeyer 'chorando' na premiere do filme em Cannes, creio yo.
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